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Inauguração da "Ecopista do Rio Minho"

Reportagem de Nuno Passos (Textos) e Dario Silva (Fotos)
14 de Novembro de 2004
Versão integral e ilustrada alta resolução: PDF 25,6 Mb

Extinta linha Valença-Monção adaptada para bicicletas, patins e peões

PRIMEIRA ECOPISTA DO PAÍS ABRIU NO ALTO MINHO

Há muitos espanhóis seduzidos pelo novo pólo turístico raiano, que é "um exemplo a seguir por outras câmaras", defendeu o Secretário de Estado dos Transportes.


"Imaginem o senhor Manuel a trabalhar no campo de milho e ver pessoas a passar ao lado de bicicleta" Ele ia pensar: "E andam os nossos impostos a ser gastos p'ra malandros"! - Duvidei muito da execução da ecopista, mas hoje não me arrependo; este canal é um contributo para que o Vale do Minho cresça na sua expressão turística e ibérica”, resumiu o presidente da Câmara de Valença, no passado dia 14 de Novembro, durante a cerimónia de inauguração da Ecopista do Rio Minho, orçada em 815 mil euros.

A abertura da “via verde” raiana, a primeira no país a aproveitar o traçado de uma ferrovia extinta (o troço Valença-Monção foi desactivado pela CP em 1990) para fins turísticos e ambientais, contou, além dos municípios promotores de Valença e Monção, com a presença do secretário de Estado dos Transportes e Comunicações, Jorge Borrego, do presidente da administração da Refer (Rede Ferroviária Nacional), José Braamcamp Sobral, e da maratonista Manuela Machado, no exterior da engalanada estação de Friestas.

Para o governante, a pista de 13 quilómetros para lazer de peões, ciclistas e patinadores é “um exemplo de uma estrutura dinâmica que demonstra o interesse das câmaras em potenciar o desenvolvimento sustentável e em fomentar a cultura ambiental”. Borrego sublinhou ainda que “este caso de sucesso é para aplicar noutras localidades do país”.

Já o autarca monçanense frisou que o “novo produto de natureza” vai cativar muitos forasteiros e permitir o “namoro entre cultura, ambiente e qualidade de vida”, fazendo assim esquecer a mágoa e nostalgia da “morte súbita e não anunciada” da antiga via-férrea.

O presidente da Região de Turismo do Alto Minho (RTAM) também se mostrou saudosista. “O caminho-de-ferro, quando não é viável, passa a vapor, como no Douro. Tentámos fazer isso aqui, mas a CP via mal a gestão da linha nas mãos do turismo. Como não houve hipótese, acho a ecovia um belíssimo aproveitamento”, clarificou Francisco Sampaio. Nas suas previsões, o percurso “tem procura e vai ter reflexos grandes” na região, nomeadamente no turismo activo, no vínculo aos trilhos de montanha e, principalmente, no turismo sénior, o segmento com mais movimento na época baixa. No entanto, Sampaio aconselha para este último sector outras condições de atractividade, ou seja, mais parques de estacionamento, lojas de artesanato e ligação ao roteiro dos vinhos.

Por seu turno, Manuela Machado, a vianense de 41 anos que venceu a maratona nos Mundiais de Atletismo de 1995 e nos Europeus de 1994 e 1998, foi peremptória em certificar a qualidade do troço e a beleza do meio ambiente, pedindo mesmo às três centenas de pessoas presentes para garantirem assiduidade no traçado. “Agora está na moda a caminhada, ir por aqui acima ao sábado e domingo é bastante agradável”, sugeriu.

Não escondendo o contentamento, o presidente anfitrião da Junta de Friestas nomeou a Ecopista do Rio Minho como “o grande acontecimento inter-concelhio dos últimos anos”, que veio eliminar um “cancro”, já que ao longo da década de 90 a linha foi sendo vítima do crescimento das copas das árvores, das chuvas e de lixo clandestino. Por isso, Manuel Álvares da Cunha pediu aprumo às edilidades e às forças de segurança na fiscalização, ordem e limpeza da via, “para que se mantenha o grande volume de adesão e persistência de pessoas a circularem para baixo e para cima a toda a hora”.

Cada um segue ao seu ritmo

Há cheiro de febras a assar, das hortaliças, das laranjas maduras e da roupa a secar. Ouve-se o cacarejar dos galos, a missa dominical galega, o som de concertinas e o vento a beijar as folhas. Há pares de namorados jovens e idosos, há pais e filhos, há amigos de longa data que se cruzam. Cada um segue à sua velocidade, calcando manchas de travagens recentes e serpenteando a ruralidade omnipresente de vinhas, leiras, canas de milho em cone, espigueiros e frases do “Le Tour du Monde” no miradouro. Há quem venha de fato de treino, capacete e joelheiras, quem traga fato executivo com sapatilhas, quem não largue a “t-shirt” do clube ou quem, simplesmente, prefira permanecer à paisana. Nas bicicletas, assomam as de alta competição, BTT, BMX ou até aquela velhinha enferrujada e poeirenta do fundo da garagem. É uma ecopista para todos.

Com o vento, José Sousa, de 48 anos, aproveita para vir “à vela” de Monção para Valença. Pedala quase todos os dias como se de uma religião se tratasse, sozinho ou acompanhado pela família e amigos. José conhece o troço do tempo do trem a vapor, que “não teve impacto na região”, “ao contrário do que se espera da linha prevista de alta velocidade”.

O atleta cruza-se de vez em quando com Fábio Magalhães, valenciano de 16 anos, que diz ter finalmente encontrado o piso adequado para circular em linha recta e em segurança com os colegas do clube local de hóquei em patins. “É um bom espaço, as pessoas podem andar à vontade, manter-se em forma e estar entretidas”, notou, não deixando, contudo, de criticar o tratamento da vegetação envolvente em certos pontos do circuito e o atraso na conclusão de alguns sistemas de apoio.

Pedro Lobato, de 50 anos, é membro de um grupo do Porto e Braga que frequentemente calcorreia os Caminhos de Santiago e já ficou adepto do circuito. Para ele, a região encontrou na nova cultura do ócio e da mobilidade não motorizada um “pólo dinamizador”. “Há que preservar e divulgar os encantos naturais e patrimoniais do Alto Minho, o desporto ao ar livre e o lazer a todas as camadas etárias”, apelou.

Ana Rosa de Jesus foi durante 14 anos guarda na Casa da Vigia de Valença, agora “maravilhosamente” transformada em Centro de Interpretação da Ecopista, e recorda as aflições de fechar as cancelas por ter trocado a proveniência dos comboios. “Eram outros tempos. Agora temos uma boa ecopista, que é um bálsamo para a saúde física e mental”, apreciou.

“Nem faz falta promoção na Galiza”

Se a nível doméstico a divulgação da Ecopista do Rio Minho foi feita no sítio da autarquia (www.cm-valenca.pt/ecopista), na colocação de desdobráveis em instituições hoteleiras, na distribuição de cartazes e na comunicação social, na Espanha não houve qualquer actividade de promoção ou publicidade específica, exceptuando as reportagens nos jornais “Faro de Vigo” e “Voz de Galicia”. No entanto, a afluência de “nuestros hermanos” ao circuito tem sido uma constante. “Quase nem faz falta promoção na Galiza, fica mesmo aqui ao lado e eles conhecem-nos bem, isto para não salientar que a melhor publicidade é mesmo o ‘boca-a-boca’”, dirimiu José Luís Serra.

Aficionado das compras no interior da muralha valenciana, o casal Areses encontrou “mais uma razão para passar os domingos em Portugal”. “É um orgulho para todos que isto se tenha reabilitado desta forma, há muitos conterrâneos nossos que virão cá por gostarem dos Caminhos de Santiago ou por motivos de saúde, e assim não precisam de ir para as vias verdes de Baiona ou do litoral de Pontevedra”, admitiu Ramón Areses. Nascido em Tui há 61 anos, ainda se lembra de acordar a escutar o comboio em Ganfei e Guilharei.

Barreiras alvo de polémica

José Teixeira, de 36 anos, visita a ecopista desde o início de Outubro. Apesar de considerá-la “óptima”, sobretudo para a saúde, é um dos que insiste em repudiar a forma como as barreiras de madeira estão colocadas junto dos cruzamentos, que geralmente servem campos de cultivo ou ruas secundárias. “Há outras formas de evitar a entrada de motas ou tractores e de controlar a velocidade máxima de 10 km/h. Podiam colocar as barreiras mais compridas ou em ‘S’ em vez de ser em ‘L’, já que mesmo um adulto não a consegue passar sem pôr os pés no chão e a barreira, como está à altura dos punhos da bicicleta, leva as pessoas a se desequilibrarem e magoarem nos dedos”, reclamou. Por outro lado, José Teixeira traz geralmente o filho acoplado à roda de trás e, neste caso, não tem mesmo a mínima hipótese de passar. “Tinha intenções de comprar uma bicicleta dupla para a minha mulher e trazer o meu outro filho para ensiná-los a pedalar, mas se nem eu posso passar…”, lamentou o valenciano, que se queixou mesmo ao respectivo autarca, tendo-lhe este, na circunstância, prometido estudar uma solução. Confrontado com a reportagem de OCOMBOIO.NET após a cerimónia de inauguração da ecopista, José Luís Serra revelou uma posição aparentemente menos calculista, e que também dificilmente servirá a cidadãos em cadeira de rodas: “As barreiras têm o tamanho e configuração das normas europeias das vias verdes. A ecopista está precisamente em processo de classificação como via verde. Por isso, não descuramos a segurança em detrimento do facilitismo e, à partida é para manter as coisas assim.”

Bombeiros socorrem... de bicicleta

Quando uma pessoa se encontrar mal disposta na ecopista, os Bombeiros Voluntários de Valença ou de Monção irão ajudar o doente essencialmente de bicicleta, pedalando rapidamente da EN 13 até ao local da ocorrência. De acordo com o 2.º comandante da corporação valenciana, Armindo Marques, os socorristas treinaram inclusive o transporte do sinistrado com a maca equilibrada entre duas bicicletas. No entanto, as ambulâncias poderão ir até aos cruzamentos do troço que fazem servidão para terrenos agrícolas.

“Os praticantes têm vindo para a pista desde Agosto e, para já, nunca aconteceu nada”, realçou Armindo Marques, destacando o facto de se evitar gradualmente o perigo de as pessoas circularem junto das estradas. Pela medição empírica do tráfego na “via verde”, que cresce “a olhos vistos”, teme conflitos entre cicloturistas e caminheiros, particularmente no frenesim do fim-de-semana. Contudo, o optimismo é a nota dominante. “Tudo vai correr bem, estamos muito atentos”, concluiu.

A primeira ecopista do país?

O troço Valença-Monção foi apregoado pela Refer e por ambas as câmaras envolvidas como “a primeira ecopista do país”. Terá sido mesmo a primeira? É que no velho troço Guimarães-Fafe há uma estrutura de características semelhantes, aproveitando igualmente um leito sulcado pelo comboio, entre 1907 e 1985. Só que ali designa-se “Pista de cicloturismo”. José Luís Ribeiro, responsável da Tempo Livre pela animação do percurso de 14 quilómetros em alcatrão, prefere pegar na questão por outro prisma. “Seja ecopista, ecovia, pista de cicloturismo, zona para peões ou velocípedes… O que interessa é existirem espaços do género, quantos mais melhor, de modo a que os hábitos das populações se tornem cada vez mais saudáveis”, realça o também presidente da Associação de Ciclismo do Minho. Recorde-se que entre nós a nomenclatura “ecopista” tem sido preferida em relação a “via verde” (tradução correcta do inglês “green way”), por esta última ser comummente aplicada desde 1991 nas auto-estradas, onde é permitido ao utilizador passar nas portagens sem parar, graças ao sensor óptico colado no vidro da viatura, que regista o percurso.

Espanhóis sugeriram equitação na ecopista

Aquando da elaboração do projecto da ecopista, as autarquias de Valença e Monção receberam uma proposta aliciante vinda da Galiza: dedicar o troço, ou parte da largura deste, à prática da equitação. Foi prontamente recusada. “Não aceitámos por uma razão muito simples. A plataforma é exclusiva para passeios a pé, bicicletas e patins. Tudo o que acrescentássemos seria desvirtuar esse conceito”, sustenta José Luís Serra, recusando-se a alterar no futuro os objectivos originais do projecto.

Travessas da extinta linha adornam Galiza

A cerca de 40 km a Norte de Monção, há meia dezena de casas outrora em ruínas que foram habilmente reabilitadas com base em materiais naturais e ecológicos, respeitando a arquitectura original. Alguns desses materiais foram as travessas de madeira onde assentaram os carris da ferrovia Valença-Monção, que agora cercam um jardim ou servem de passagem pedonal, entre outros fins. A aldeia de turismo rural chama-se Lugar dos Devas (www.lugardosdevas.com) e situa-se na localidade de Covelo, em Pontevedra. O pequeno éden de lazer, com ímpar fauna e flora e um precioso património histórico e artístico envolvente é um dos pontos onde as travessas (na gíria ferroviária conhecidas por chulipas) alto-minhotas jazem, tendo-se assim readaptado na tarefa de servidão ao Homem. Quanto aos restantes paralelepípedos de madeira alto-minhotos, dificilmente se encontrará o seu paradeiro.

Ainda se ouvem comboios em Monção

Para emigrantes ou turistas que pretendam chegar o mais próximo possível de Monção através de comboio, a única solução é desembarcar num país estrangeiro. Da outra margem do Rio Minho, desembocam na estação de Salvaterra do Minho composições de Ourense ou Madrid, não raras vezes preenchidas com operários sazonais vindos um pouco de todo o noroeste luso. Aliás, Salvaterra do Minho vai ter em breve um grande núcleo modal de transportes a nível peninsular, o que é considerado pelo presidente da RTAM, Francisco Sampaio, como “uma clara falta de estratégia nossa para com a Galiza”. O vento, esse, vai continuar a trazer à terra do Alvarinho o som de uma nostalgia que desta banda terminou fisicamente no último dia de 1989.

Vir de bicicleta no comboio até ao Alto Minho

Mora em Vila Real de Santo António, em Vilar Formoso ou no Pocinho? Gosta de desporto e da natureza, tanto quanto aprecia uma boa viagem de comboio? Então de que é que espera para correr até à sua estação ou apeadeiro e subir os degraus da carruagem com o guiador e o quadro da bicicleta nas mãos rumo à primeira ecopista do país? Exacto, as composições da CP possuem um furgão exclusivo para guardar acessórios relativamente volumosos dos clientes, como bicicletas, “skates” ou pranchas de surf. Assim, logo que chegar à raia galego-minhota, basta então repartir o tempo a deslizar pela pista, a conhecer a rica cultura local ou simplesmente respirar sossego. Por isso, só falta dizer: boas pedaladas!

PRINCIPAIS DATAS

06/08/1882 – Chegada do comboio a Valença

25/03/1886 – Primeira ligação ferroviária à Galiza, sob projecto do arquitecto espanhol Pelaio Mancebo

02/05/1904 – Aprovação de Decreto para o Governo contactar George Blackwood sobre a construção da linha Braga-Monção (projecto em via estreita nunca implementado com passagem prevista por Ponte de Lima, Ponte da Barca e Arcos de Valdevez)

1915 – Chegada do comboio a Monção

05/06/1977 – Inauguração do Museu Ferroviário de Valença, na antiga cocheira de locomotivas

01/01/1990 – Encerramento do ramal de Monção

14/11/2004 – Extinta linha Valença-Monção torna-se na primeira ecopista do país

815 MIL EUROS DE INVESTIMENTO

Idealizada há oito anos pelos edis José Emílio Moreira e Fernando Barbosa, a obra custou 815 mil euros (448 mil da ala valenciana, 367 mil na congénere monçanense), co-financiados pelo programa comunitário Interreg III. O contrato de concessão e utilização da antiga linha, desactivada a 31 de Dezembro de 1989, obriga as duas autarquias envolvidas a pagar à Refer o aluguer anual de 2800 euros. O protocolo vigora por 25 anos, sendo posteriormente passível de renovação a cada cinco anos.

Em Valença, a antiga Casa de Vigia da Linha, na Ponte Seca, foi transformada em Centro de Interpretação da Ecopista do Rio Minho, a porta de entrada no trajecto. Aqui, há sala de exposições – com painéis descritivos da via e da história férrea alto-minhota desde 1875 –, gabinete informativo e parque de estacionamento. Em Ganfei, Verdoejo e Friestas, recuperaram-se os WC e abrigos e foi limpo o matagal envolvente. Em Friestas, sensivelmente o centro quilométrico do canal, implantou-se igualmente um parque de estacionamento e uma área de lazer e reabilitado o miradouro e a histórica ponte metálica do Manco, sobre o rio Furna.

Da ala de Monção, foram restaurados os sanitários e criado um parque de merendas em Lapela e Cortes, beneficiada a ponte de Gadanha, em Troporiz, e a estação de Monção foi adquirida pela autarquia para ser recuperada. Entretanto, estão a ser instalados painéis informativos e miradouros. O antigo apeadeiro de Nossa Senhora da Cabeça, em Cortes, ponto terminal da ecopista, tem mostra de fotografias antigas, como o cartaz original da chegada do comboio em 1915, as locomotivas que cruzaram a via e a descrição das velhas artes da pesca, do contrabando e das práticas agrícolas, além de algum material alusivo, nomeadamente bandeiras, insígnias, fardas e lanternas.

CARACTERÍSTICAS DA ECOPISTA DO RIO MINHO

O circuito, que deve o nome ao curso internacional que o ladeia a Norte, possui 13 quilómetros de comprimento e três metros de largura, apresentando orografia suave. Da antiga via-férrea, perderam-se escassos quilómetros nas extremidades e substituíram-se as travessas e carris por uma película sintética de cor avermelhada (parte valenciana) e creme (parte monçanense) sobre um piso de alcatrão de cinco centímetros. Não existe qualquer linha contínua central a demarcar o sentido do trânsito, ao contrário nomeadamente de Fafe. Em média, o troço é percorrido numa hora a pedalar ou entre duas a quatro horas a andar. Geralmente, os que andam a pé não cumprem toda a extensão do circuito, preferindo chegar a meio do caminho e regressar. Para isso, há abrigos, sanitários, água potável e papeleiras na maioria dos outrora apeadeiros e estações, que estão escalados por esta ordem: Valença, Ganfei, Verdoejo, Friestas, Lapela, Troporiz e Senhora da Cabeça (Cortes). Ao longo do trajecto, que serpenteia ínsuas, matas e arroteamentos e está integrado na Rede Natura 2000, podem-se encontrar animais como o sável, esgana-gata, texugo, milhafre ou verdilhão e árvores como o amieiro, tojo ou salgueiro. Consegue-se também perscrutar um património rico, designadamente a catedral e as termas de Tui, a velha ponte metálica e a fortaleza de Valença, o mosteiro beneditino de Ganfei, a Torre de Menagem de Lapela ou os terrenos nevoeirentos onde são produzidas as famosas castas de Alvarinho. No canal, é expressamente proibido caçar, fazer ruído, fogo ou lixo, danificar a natureza ou a pista, acampar, trazer cães sem trela e, ainda, circular de veículos motorizados, a cavalo ou com gado. Os prevaricadores poderão ter de desembolsar até 45 mil euros. A manutenção da via é garantida por três funcionários camarários, embora se apele aos moradores e utentes para sinalizarem e, caso seja possível, corrigirem, actos de vandalismo. Por fim, poderão ser realizadas provas desportivas, mediante autorização das autarquias.

Artigos urbanos da Refer com plano até 2006

Ainda não foi decidido um fim para os edifícios dos apeadeiros e estações entre Valença e Monção. O Grupo Etnográfico de Ganfei pretende ter a sua sede física no imóvel local. Em Friestas, o desejo é similar, visto ser necessário um espaço para o rancho infantil e adulto, onde se consiga ensaiar, conviver, arquivar memórias documentais e inclusive estabelecer um museu do traje, onde se destaque as vestes e profissões praticadas antigamente. Como à partida não cabe tudo no imóvel, o presidente da Junta, que é vice-presidente do grupo folclórico, vai sugerir em breve à Refer a construção de um pavilhão anexo ao lado do edifício da estação, em moldes a combinar.

Instado a comentar estas propostas, até porque se inserem numa região com vários casos de sucesso de reaproveitamento de artigos urbanos ligados ao caminho-de-ferro – particularmente nas estações de Carreço e Afife (no primeiro mora o Centro Cultural e Social, no segundo está o Grupo Desportivo autóctone) –, o presidente da Refer explicou que o tema “é muito mais vasto”.

“Temos milhares de artigos urbanos de Valença a Vila Real de Santo António. Só no Alentejo existem mil, desde grandes casas a pequenas estruturas de passagem de nível. Daí que temos vendo este processo com ponderação, mas não com lentidão”, caracterizou, prometendo avançar com um plano nacional detalhado durante os próximos dois anos, nomeadamente através da sub-empresa Invesfer, que gere e dinamiza o departamento mobiliário e o património degradado do organismo. Uma das principais áreas onde a companhia ambiciona captar parcerias para investir é nos ramais desactivados do Douro, que possui “enquadramentos paisagísticos únicos” e “é ideal para cativar o turista”.


REFER DIVULGA PLANO ESTRATÉGICO DAS ECOPISTAS

Mora, Corgo, Grândola e Ponte D. Maria Pia vão seguir o exemplo do ramal de Monção

No próximo dia 19 de Novembro, Portugal acolhe pela primeira vez um congresso internacional dedicado às ecovias. Do lado anfitrião, a Refer pretende apresentar o Plano Estratégico das Ecopistas, em colaboração com as 39 autarquias envolvidas até ao momento. Aquela instituição deve ainda revelar a cartografia com os canais ferroviários desactivados a reconverter em ecovias, bem como as metodologias de parcerias e concessões a desenvolver a curto e médio prazo.

O encontro conta com a presença da Associação Europeia das Vias Verdes (www.aevv-egwa.org) e de vários oradores estrangeiros, que partilharão as suas experiências regionais e nacionais. A par dos italianos e ingleses, os espanhóis são dos que têm melhores histórias para contar. A Fundación de los Ferrocarriles Españoles, que coordena o Programa Vias Verdes, recuperou numa década 1300 dos 7000 km de vias ferroviárias votadas ao abandono para itinerários cicloturistas e de caminhadas. Segundo o sítio http://www.ffe.es/viasverdes/index.html, existem actualmente no país vizinho 23 vias verdes, englobando um total de 75 trajectos diferentes “articulados em rede”.

Câmaras contagiadas pela “moda”

A Refer tem presentemente mais de uma dezena de acordos pré-estabelecidos com autarquias para a implantação de ecopistas. De acordo com Braancamp Sobral, as negociações estão mais avançadas no ramal de Mora (envolve os municípios de Évora, Arraiolos e Mora), na linha do Corgo (agrega Vila Pouca de Aguiar, Chaves e Vila Real) e em Grândola.

A Ponte D. Maria Pia, que deixou de ligar Porto e Gaia por comboio em 1991, é outro dos poisos, esperando a Refer reabrir o monumento ao trânsito pedonal e velocipédico até à próxima Primavera. Depois de estudos e reuniões desde 2003, concluiu-se que a obra de Eiffel, inaugurada em 1877, persiste com padrões mínimos de segurança. “Além de mantermos este ‘ex-líbris’ do Norte, criamos também uma oportunidade lúdica e convidamos as populações a ver as margens do Douro de outra forma”, ilustrou Braancamp Sobral, aguardando que as autarquias envolvidas acelerem o processo de candidatura a fundos da UE para a execução do projecto.

O presidente da Rede Ferroviária Nacional está esperançado que Portugal tenha “daqui a dez, doze anos” uma rede própria e integrada de ecopistas, que lhe garanta ser aliado numa rede europeia forte onde o cidadão possa atravessar diferentes países em vias verdes, tendo sempre ao dispor diversas alternativas e meios de apoio. Sobral apoia o seu anseio na corrente “moda” pelos desportos de natureza e passeios ao ar livre e na “diminuição das reticências e receios” das edilidades. Paralelamente, há o aliciante de haver verbas comunitárias disponíveis para este tipo de iniciativas e a “parceria constante” da Refer, ao providenciar projectos e auxílio técnico.

As “desaparecidas” ferrovias poderão, portanto, ser vasos comunicantes com ecovias aproveitadas de arruamentos secundários, como é o caso de Gamil, em Barcelos, ou da ligação Ponte de Lima-Bertiandos, uma recta paralela à EN 202 que, curiosamente, usa parte do leito da via-férrea Viana do Castelo-Ponte do Lima, que no início do século XX chegou a ter carris colocados em solo vianense e locomotivas novas, mas nunca chegou a ser efectivamente concretizado (Este projecto em via estreita nunca concretizado, teria entroncado em Ponte de Lima na via férrea proveniente de Braga; no local outrora pensado para a estação de Ponte de Lima, encontra-se a apreciável praia fluvial do Arnado).

Linha Viana do Castelo-Valença poderá sofrer cortes a partir de 2005

Em meados do próximo ano, a Refer vai divulgar e proceder a alterações na Linha do Minho, no âmbito do esperado traçado do TGV. De acordo com o presidente da empresa, estão a ser ultimados os estudos sobre a rede portuguesa de alta velocidade e não está aparentemente afastada a hipótese de supressão do transporte de passageiros entre Viana do Castelo e Valença. “Até Viana não há tecnicamente grandes problemas, para Norte é que as soluções escasseiam, embora existam variadíssimos cenários possíveis”, admitiu Braancamp Sobral, lembrando que “ainda é cedo” para avançar conclusões e que “há bastante optimismo” relativamente ao futuro daquele percurso. Publicação online: 22 de Novembro de 2004